Liminar afirma que existem fortes indícios de desvio de verba pública no governo Ronaldo


Tivemos acesso à liminar de bloqueio dos bens do ex-prefeito José Ronaldo de Carvalho e de outros servidores da Prefeitura, a exemplo da Secretária de Saúde, Denise Mascarenhas e do ex-procurador Cleudson Almeida. 

Segundo o documento expedido pelo Juiz Federal Alex Schramm de Rocha, existem indícios concretos sobre as práticas ilícitas e desvios de recursos da saúde em Feira de Santana, a ausência de especificação do objeto licitado e exigências ilegais e restritivas contidas nos editais, a favorecer a contração daquela cooperativa, a exemplo da exigência de registro no CRA, exigência desproporcional de registro em pelo menos 10 conselhos de classe distintos, exigência de vistoria ao local de prestação dos serviços, entre outros.

Ainda segundo o Juiz, tais exigências foram ignoradas, o que reforça o indício de que houve favorecimento da cooperativa COOFSAÚDE e que há fortes indícios de que houve contratação ilegal da COOFSAUDE para intermediação de mão de obra, caracterizada a terceirização ilegal em burla à Lei de Responsabilidade Fiscal.

O Juiz também especifica na liminar que os editais relativos às concorrências públicas CP 006/2015 e CP 003/2016 não representam qualquer especificação dos serviços que foram contratados, que se limitam a uma única página, sem quaisquer informações que deem pistas do que está sendo licitado. Que não há uma descrição detalhada dos locais onde os serviços seriam prestados, tais como endereço e horário de funcionamento, nem das escalas de trabalho, tais como horários da jornada, frequência e periodicidade. 

Ainda diz que não há descrição detalhada dos materiais e equipamentos a serem fornecidos e utilizados; métodos ou rotinas de execução do trabalho e das etapas a serem executadas; procedimentos, metodologias e tecnologias a serem empregados; cuidados, deveres e disciplina exigidos; níveis de qualidade e de produtividade do serviço e mecanismos de aferição; forma de aferição/medição do serviço para efeito de pagamento com base em resultado; registros e informações a serem prestadas e controles a serem adotados. 

Sobre a cooperativa, o Juiz diz que ela não realizou qualquer fiscalização ou acompanhamento direto sobre as atividades dos supostos cooperados e nem prestou qualquer tipo de assistência ou orientação técnicas, que todos os profissionais entrevistados informaram que respondem diretamente à Secretaria de Saúde, de quem recebem instruções e supervisão direta, e a quem reportam qualquer questão relacionada à prestação de suas atividades.

A liminar ainda diz que no que tange aos pagamentos efetuados à COOFSAÚDE, também há informações que indicam o desvio de recurso público. Segundo o juiz, a  nota técnica n. 5108/2018 -NAE/CGU – Regional/BA (Id. 173754889) consigna informação de que os pagamentos realizados pelo Fundo Municipal de Saúde à COOFSAÙDE, em relação aos contratos 101/2016, 264/2015 e 077/2014, tiveram como fonte, além de recursos próprios do Município, também Transferências de Recursos do Sistema Único de Saúde – SUS, nos valores de R$24.651.120,18, R$15.375.342,88 e 18.329.964,54, respectivamente e que a  Nota Técnica n. 5097/2018 - NAE/CGU – REGIONAL (id. 173754888- pag.71/72) registra que a COOFSAÚDE, durante o período de fevereiro de 2016 a julho de 2017, teve faturamento, proveniente de pagamentos efetuados pela Prefeitura de Feira de Santana/BA, no montante total de R$95.744.748,13, tendo sido apurado superfaturamento de 25,07%, ou seja, no montante de R$23.990.288,81. 

No documento, o juiz conclui dizendo que as posições dos agentes públicos requeridos – Prefeito, Secretária de Saúde, Presidente da comissão de licitação e procuradores do município – indicam atuação conjunta para obtenção do resultado  ímprobro, o que em princípio, pressupõe responsabilidade solidária pelo ressarcimento ao erário. Confira abaixo, o trecho da liminar que fala sobre a decisão.

É o relatório. Decido. 

Nos termos dos artigos 7º e 16 da Lei n. 8.429/92, para concessão de medida cautelar de indisponibilidade de bens se faz indispensável a presença do periculum in mora e do fumus boni iuris, sendo que tais requisitos exigem fortes evidências da gravidade dos fatos e fundado receio de ineficácia da prestação da tutela jurisdicional. O fumus boni iuris enseja análise judicial a partir de critérios de mera probabilidade, em cognição provisória, avaliando-se a plausibilidade do direito pleiteado pelo requerente a partir de suas alegações e dos elementos probatórios que as embasam. 

No caso, o exame dos elementos constantes dos autos conduz à conclusão quanto à existência de indícios concretos sobre as práticas ilícitas e desvios de recursos narrados na inicial. Com efeito, a Nota Técnica n. 5097/2018 - NAE/CGU – REGIONAL (id. 173754888) descreve as irregularidades constatadas nos processos de licitação que ensejaram a contratação da COOFSAÚDE (Contrato n. 101/2016, Contrato n. 77/2014 e Contrato n. 264/2015), tais como ausência de especificação do objeto licitado e exigências ilegais e restritivas contidas nos editais, a favorecer a contração daquela cooperativa, a exemplo da exigência de registro no CRA, exigência desproporcional de registro em pelo menos 10 conselhos de classe distintos, exigência de vistoria ao local de prestação dos serviços sem justificativa, exigência de atestado de capacidade técnico-operacional com quantidade mínima desproporcional à quantidade licitada, e, ainda, exigência cumulativa de patrimônio líquido mínimo e garantia de participação na licitação, vedados no art. 31, §2º, da Lei 8.666/93 e na Súmula TCU 275. 

Tais apontamentos são possíveis de serem verificados nas cópias dos editais do Pregão Presencial 001/2014 (id. 173763846), da Concorrência Pública 006/2015 (id. 173763856) e da Concorrência Pública 003/2016 (id. 173763860). Referida nota técnica ainda consigna que, a despeito das exigências restritivas contidas no edital aptas a impedirem a participação de possíveis interessados no objeto licitado, quando do julgamento das propostas da COOFSAÙDE, tais exigências foram ignoradas, o que reforça o indício de que houve favorecimento da cooperativa. Conforme descrito na nota técnica supramencionada, há fortes indícios de que houve contratação ilegal da COOFSAUDE para intermediação de mão de obra, caracterizada a terceirização ilegal em burla à Lei de Responsabilidade Fiscal:

 “ O contrato n º 060/2011, firmado em 17 de junho de 2011, se deu em decorrência do processo licitatório CP 003/2011. Posteriormente, a COOFSAUDE foi novamente contratada, por meio do contrato n. 077/2014 de março de 2014, atualmente ainda em vigor, proveniente do processo licitatório PP 001/2014. Em novembro de 2015 a COOFSAUDE foi mais uma vez contratada, agora mediante o processo licitatório relativo à CP 006/2015, que culminou com o Num. 181869367 - Pág. 2 Assinado eletronicamente por: ALEX SCHRAMM DE ROCHA - 02/03/2020 17:48:05 http://pje1g.trf1.jus.br:80/consultapublica/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20030217480506900000178591970 Número do documento: 20030217480506900000178591970 contrato nº 264/2015, ainda em vigor. 

Finalmente, visando à substituição do contrato nº 060/2011, cuja prorrogação já não era mais possível por atingir o limite legal de 60 meses de vigência, a Prefeitura deu origem à licitação CP 003/2016, por meio da qual contratou novamente a COOFSAUDE (contrato nº 038/2016 de junho de 2016). (...) Em que pese os objetos das citadas licitações fazerem referência a contratação de empresa especializada e em prestação de serviços na área da saúde pública, o que se percebe da análise dos respectivos processos administrativos instaurados é que a intenção da Administração sempre foi a contratação de empresa para simplesmente intermediar o fornecimento de mão de obra. 

Os editais relativos às concorrências públicas CP 006/2015 e CP 003/2016 chegam ao absurdo de não apresentar qualquer especificação dos serviços a serem contratados. Em tais editais o Termo de Referência se limitam a uma única página, sem quaisquer informações que deem pistas do que está sendo licitado. (...) Por exemplo, não há uma descrição detalhada dos locais onde os serviços seriam prestados, tais como endereço e horário de funcionamento, nem das escalas de trabalho, tais como horários da jornada, frequência e periodicidade. 

Também não há descrição detalhada dos materiais e equipamentos a serem fornecidos e utilizados; métodos ou rotinas de execução do trabalho e das etapas a serem executadas; procedimentos, metodologias e tecnologias a serem empregados; cuidados, deveres e disciplina exigidos; níveis de qualidade e de produtividade do serviço e mecanismos de aferição; forma de aferição/medição do serviço para efeito de pagamento com base em resultado; registros e informações a serem prestadas e controles a serem adotados. A falta de especificação adequada dos serviços a serem prestados sinaliza a verdadeira intenção da Prefeitura de obter mera intermediação de mão de obra, quando, em verdade, os profissionais disponibilizados passariam a ser diretamente subordinados e geridos pela Secretaria de Saúde, sem qualquer serviço agregado pela Contratada além do mero vínculo trabalhista com os profissionais. (...) Após a formalização do vínculo com a Cooperativa, todas as atividades dos profissionais passam a ser organizadas e coordenadas pela Administração Municipal. 

A Cooperativa não realiza qualquer fiscalização ou acompanhamento direto sobre as atividades dos supostos cooperados e nem presta qualquer tipo de assistência ou orientação técnicas. Todos os profissionais entrevistados informaram que respondem diretamente à Secretaria de Saúde, de quem recebem instruções e supervisão direta, e a quem reportam qualquer questão relacionada à prestação de suas atividades, comprovando a pessoalidade e a Num. 181869367 - Pág. 3 Assinado eletronicamente por: ALEX SCHRAMM DE ROCHA - 02/03/2020 17:48:05 http://pje1g.trf1.jus.br:80/consultapublica/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20030217480506900000178591970 Número do documento: 20030217480506900000178591970 subordinação direta com a Prefeitura Municipal. (...) Verifica-se ainda a burla a Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF, já que a Prefeitura de Feira de Santana não contabiliza como sendo de pessoal toda a despesa com essa “terceirização”, substitutiva de mão de obra. 

O que se verificou por meio de consulta ao Sistema Integrado de Gestão e Auditoria do Tribunal de Contas dos Municípios do Estado da Bahia - Siga/TCM foi que a Prefeitura de Feira de Santana vem contabilizando toda a despesa incorrida com o contrato de terceirização no grupo de despesa “3 – Outras Despesas Correntes”, que não é levado em conta para o cálculo do limite estabelecido no art. 19 da LRF. O correto seria a contabilização no grupo de despesa "1 – Pessoal e Encargos Sociais", numa das contas de "Outras Despesas de Pessoal decorrentes de Contratos de Terceirização, atendendo ao art. 18, § 1º, da LRF.” (id. 173754888 - Pág. 40/45) No que tange aos pagamentos efetuados à COOFSAÚDE, também há informações que indicam o desvio de recurso público. A nota técnica n. 5108/2018 -NAE/CGU – Regional/BA (Id. 173754889) consigna informação de que os pagamentos realizados pelo Fundo Municipal de Saúde à COOFSAÙDE, em relação aos contratos 101/2016, 264/2015 e 077/2014, tiveram como fonte, além de recursos próprios do Município, também Transferências de Recursos do Sistema Único de Saúde – SUS, nos valores de R$24.651.120,18, R$15.375.342,88 e 18.329.964,54, respectivamente. A Nota Técnica n. 5097/2018 - NAE/CGU – REGIONAL (id. 173754888- pag.71/72) registra que a COOFSAÚDE, durante o período de fevereiro de 2016 a julho de 2017, teve faturamento, proveniente de pagamentos efetuados pela Prefeitura de Feira de Santana/BA, no montante total de R$95.744.748,13, tendo sido apurado superfaturamento de 25,07%, ou seja, no montante de R$23.990.288,81. 

Segundo apurado pela CGU (id. 173754888 – Pag. 50 e ss.), em relação ao contrato 101/2016, constatou-se pagamento excessivo em quase todos os meses entre janeiro/2016 e julho/2017: “Por exemplo, no mês de julho/2016, de acordo com a correspondente lista fornecida pela Prefeitura, prestaram serviço 90 médicos, 148 enfermeiros e 39 odontólogos. No entanto, de acordo com o boletim de medição apresentado pela COOFSAUDE, que consta dos processos de pagamento nº 07031, 07032, 07033, 07135 e 07136/16, a Prefeitura pagou por um total de 104 médicos, 149 enfermeiros e 38 odontólogos. Em outro exemplo, no mês de março/2017, a Prefeitura relacionou 91 médicos, 139 enfermeiros e 35 odontólogos. Enquanto a COOFSAUDE faturou o referente a 104 médicos, 143 enfermeiros e 38 odontólogos (processo de pagamento nº 02768, 02769, 02772, 02773-17). 

Essas diferenças ocorreram em todos os meses do período analisado, com quantidades consideráveis de profissionais cobrados a maior.” Ainda de acordo com a Nota Técnica, quanto ao contrato 77/2014, houve pagamento dos profissionais em valores acima dos contratados, sem respaldo em outros documentos. Além de pagamento em duplicidade aos mesmos profissionais: Num. 181869367 - Pág. 4 Assinado eletronicamente por: ALEX SCHRAMM DE ROCHA - 02/03/2020 17:48:05 http://pje1g.trf1.jus.br:80/consultapublica/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20030217480506900000178591970 Número do documento: 20030217480506900000178591970 “Por exemplo, o profissional médico Igor de Souza e Silva aparece por duas vezes no pagamento da competência do mês de março/2017 do contrato nº 077/2014, além de aparecer nos pagamentos dos contratos nº 264/2015 e nº 101/2016 de mesma competência. 

Considerando a previsão contratual, esse profissional foi pago por contratos que totalizam130 horas semanais. Considerando que os contratos preveem carga horária de 30 ou 40 horas semanais a depender da função, há profissionais sendo pagos por contratos que somam até 150 horas semanais.” (id. 173754888 - Pág. 55/56) Os processos de pagamentos mencionados na referida nota técnica foram juntados aos autos, em id’s. 173763865, 173763867, 173763876, 173763882, 173763886 e 173763894. Assim, com base no exame dos documentos que instruem a inicial, entendo haver fortes indícios de responsabilidade dos agentes na consecução do ato ímprobo, atinente ao dano material ao erário. Ressalte-se que as posições dos agentes públicos requeridos – Prefeito, Secretária de Saúde, Presidente da comissão de licitação e procuradores do município – indicam atuação conjunta para obtenção do resultado  ímprobro, o que em princípio, pressupõe responsabilidade solidária pelo ressarcimento ao erário. 
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